Em (lutar)…
Aristela Barcellos de Andrades, Psicóloga, Psicanalista e Membro Fundadora do Salpêtrière Espaço Psicanalítico
Breve desabafo de um dia de junho de 2023
O que é o luto? Sinto que vivo (re)luta(ndo) minhas perdas. Perdas de algo que nem mesmo vivi, mas tenho lembranças, sensações, saudades de algo não sentido hoje. Ultimamente, as lágrimas escorrem, sem mesmo fazer muita força, percebo a diferença existente e avassaladora que ao mesmo tempo não faz mais diferença, talvez isso me cause um certo espanto. Sinto-me perdendo as forças de lutar por questões que só me trazem tristeza, após uma alegria fugaz. Ilusões, sentimentos, sorrisos, perda de sono, o imaginário voa bem longe…
Me sinto sem forças, sem vontades, nem de escrever corretamente: sinto-me… a cada perda de algo que não acontece, é uma aposta que se vai, a ilusão não causa mais transtorno e nem o mais possível do senso comum: fulano (a) me enganou! De tão comum e vazio que as relações se tornaram, isso virou rotina, porém, eu não consigo me acostumar com isso e permaneço na solidão. Adoro a solitude e trabalho bem na minha solidão, mas, às vezes, ela é arrebatadora, pois são raras as pessoas que compartilham de sensações e sentimentos semelhantes. Na maioria das vezes, falo ao próprio vazio e como ele é oco o que volta é a minha própria voz sozinha, um eco triste e solitário de mim mesma.
Penso que ser sincera e desejar a reciprocidade é algo fora da curva, fora da vida…tanto que sinto até medo de achar que alguém tem essas virtudes que venho me afastando das pessoas e do mundo. Minha casa, meu lar, são meus refúgios. Cada objeto colocado no seu devido lugar, ideias construídas juntamente a outras pessoas, mas com a minha escolha. Entro e não quero sair, me sinto protegida da crueldade alheia, da fragilidade do outro e cuido da minha aqui dentro. Quieta, tomando um café, cansada precisando de férias, pelo menos acho que é isso, ou na verdade estou me iludindo sobre essa situação. Tenho medo de não conseguir ficar bem e voltar do descanso merecido do mesmo jeito, voltar triste, pois a realidade é essa. Mudar como e para que? Já mudei, enfrentei, vi tanta coisa que não vejo nada muito além…por ora, a luz no fim do túnel é o pôr-do-sol belíssimo e abençoado que vejo na sacada do meu refúgio, o meu lar. Vejo sua beleza e tento deixar essa luz entrar dentro de mim e peço que me ajude a tirar isso que sinto, o que sinto? Nomeei de luto, luto de/pelo um grande amor… e em (luta) diária para não achar que aquilo foi um grande amor…