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Revista Cot(id)ianos – Texto 5: Aos pâmpanos que não florescem: até quando permaneceremos na errância?

Aos pâmpanos que não florescem[1]: até quando permaneceremos na errância?

Aristela Barcellos de Andrades – Membro e Fundadora do Salpêtrière Espaço Psicanalítico

Texto escrito em 2021

Ler sobre a psicose foi algo que sempre chamou a minha atenção durante minha graduação devido, principalmente, aos últimos estágios e projetos de extensão que fiz juntamente a famílias de sujeitos ditos psicóticos. A primeira “paciente” que recebi no estágio era uma moça de 17 anos com um diagnóstico confuso de autismo e psicose, sendo que um dos principais “sintomas” era que ela falava a “língua alemã”, segundo os outros estagiários, pois não entendiam absolutamente nada do que ela dizia.

 No estágio final não foi diferente, recebi alguns sujeitos com diagnósticos de esquizofrenia, paranoia, autismo ou, por exemplo, F32 do CID – 10[2]. Este caso, era uma mulher que chegou no plantão na clínica escola onde fazia meu estágio e quando perguntei o seu nome, ela disse: – Sou F32 e mais alguma coisa! e me entregou o papel do encaminhamento realizado no posto de saúde que dizia F32.3 (Episódio depressivo grave com sintomas psicóticos do CID – 10). Ela se reconhecia como um número, sem se questionar, foi isso que o médico disse a ela, logo, ela acatou imediatamente a esta “lei”. Após receber a moça de 17 anos, citada anteriormente, no serviço da psicologia, vi que em seu prontuário ela era atendida pelos serviços de fisioterapia e terapia ocupacional, sendo assim, fui conversar com os outros estagiários para tentar estabelecer uma conversa com eles em relação aos atendimentos. Indo até o serviço da fisioterapia no estágio de neuropediatria, percebi a quantidade de crianças e adolescentes que apresentavam algum sofrimento psíquico e que chegavam ali e não eram encaminhadas para o serviço de psicologia. Conversei com a professora responsável pela fisioterapia e com o meu orientador e segui fazendo meu estágio ali também, juntamente ao estágio do curso de fisioterapia. 

Passados alguns anos, estava em um evento em que um psicanalista disse: – Os psicóticos não chegam aos consultórios particulares, somente vão para as instituições de saúde mental. Essa fala me surpreendeu naquele momento, pois recebo sujeitos ditos psicóticos e não trabalho em uma instituição, mas me surpreendeu, ainda mais, pois esse dito me fez pensar qual é o olhar do analista ou daquele que trabalha numa instituição, por exemplo, em relação ao sujeito? Com esse breve histórico de como iniciei meus estudos frente a psicose, quero contextualizar um pouco por onde irei percorrer nesse texto, para pensarmos juntos e de forma crítica de que maneira percebemos e olhamos ao sujeito dito psicótico. 

Nesse trabalho tentarei fazer uma releitura crítica em relação ao trabalho de Jacques Lacan em torno da psicose em seu Seminário III – As psicoses[3] de 1955 (2002) e que segundo Roudinesco (1993)[4] o título original seria: As estruturas freudianas das psicoses, como também, a sua tese Da psicose paranoica em suas relações com a personalidade[5], como as apresentações de pacientes[6]. Nesses trabalhos, Lacan traz a sua construção sobre a psicose, tanto em questões clínicas, quanto nosográficas e o tratamento frente ao psicótico, retomando Freud e apontando aquilo que ele acreditava ser relevante. 

Lacan inicia seu seminário trazendo um histórico sobre a psicose, a diferença que Freud faz entre as esquizofrenias (parafrenias) e as paranoias. Além disso, traz também o trabalho de Gaïtan Gatian de Clérambault psiquiatra francês e representante da Psiquiatria Clássica a quem Lacan considerou como sendo o seu único mestre e no qual, frente a sua experiência na antiga enfermaria especial para enfermos mentais da polícia da Prefeitura de Paris e influenciado pelo pensamento mecanicista da época, proporcionou uma descrição e classificação completa dos sintomas psicóticos, percebendo por fim, que todos esses sintomas psicóticos poderiam ser definidos por uma única e comum característica, o automatismo mental, ou seja, que a alucinação e o delírio são de ordem orgânica e hereditária. A alucinação e o delírio são tidos como fenômenos elementares no sujeito psicótico, mostrando isso no registro da fala, atenuando o reconhecimento do imaginário, da fantasia, ele diz: “…para ser louco, é necessária alguma predisposição, se não alguma condição (2002, p. 23)” e consequentemente “não se torna louco quem quer (2002, p. 24)”. Mas o que é ser louco? O que é a loucura?  

Ao participar do Grupo de Trabalho GT – Psicanálise pós-edipiana do Instituto Langage, penso que a pergunta passa a ser outra, portanto, o que é um sujeito? Se seguirmos o que Lacan traz em seu seminário sobre as psicoses, como também, alguns autores renomados neste assunto, encontramos a mesma fórmula freudiana sobre o mito edípico, portanto, aquele que se torna psicótico não conseguiu sair do édipo, ficou preso na alienação, pois não ocorreu o processo de separação onde aquele que faria a função paterna barrando o gozo da mãe perante ao seu bebê falhou, dessa forma, o bebê permanece alienado ao gozo materno[7]. Isso, pois, a mãe não deu espaço a esse pai em permiti-lo entrar nessa relação e apresentar a cultura a esse bebê e o mesmo entrar na linguagem. 

Para alguns autores como Contardo Calligaris o sujeito psicótico nem sujeito é “… se o sujeito psicótico não é um animal…” (2013, p. 70)[8], o que é então? Essa forma como alguns psicanalistas olham, lêem a psicose, ou mesmo, as outras estruturas psíquicas, em que o sujeito se encontra preso a amarras onde existe uma forma fechada de ser, no qual ao se fazer algo diferente da dita “normalidade” se é considerado outra coisa, é extremamente retrocessa. E mais provavelmente ainda, é nomeado como um louco, onde esse dito de normalidade é o correto e, o diferente é porque ocorreu algo de errado, inclusive na constituição do sujeito, no entrelaçamento da trança no nó borromeu[9], onde possivelmente deve ter ocorrido “um acidente, um fracasso, um erro” todos levando à psicose ou ao autismo, por exemplo. Esse entrelaçamento “diferente, realizado de outra forma” não poderia ser considerado uma forma outra de se constituir, uma outra possibilidade para além do édipo que não seja adoecedora, patologizante?

A psicanálise vem há décadas tentando retificar a sua própria problemática, ou seja, a dificuldade do analista em lidar com esse “novo” que aparece no discurso do outro, nomeando isso como um delírio psicótico, por não conseguir escutar para além de suas próprias amarras. Até mesmo, dizendo o quanto é difícil aguentar (grifo meu) a constituição do delírio do psicótico, como diz Calligaris (2013). Como assim, aguentar? Na escuta não se aguenta, escuta-se, interpreta-se. Lacan diz que frente a psicose não recuamos, mas por que se aguentaria o discurso? Será a dificuldade em escutar aquilo que é muito diferente do seu imaginário em relação ao que seria esse discurso do outro? Muito diferente do que é compartilhado comumente ao social? Será esperado do sujeito psicótico suas fenomenologias? O surto? Delírios extravagantes? Alucinações inimagináveis?

Quando se está frente a teoria edípica, pensa-se o sujeito dentro das estruturas, paramos ali, nada além, o sujeito pode ser neurótico, psicótico ou perverso, ele é uma estrutura e está enquadrado nessas categorias. Ao mesmo tempo, alguns psicanalistas se acham no direito de realizar e enfatizar críticas frente as categorias nosográficas, psiquiátricas como o DSM-V e CID-10, por exemplo, esquecendo que essa tripartição estrutural psicanalítica também é uma forma de categorizar o sujeito. Dessa forma, essa categorização tenta responder a um pedido social de normatização do psicótico, por exemplo, ao entupirem esses sujeitos de medicação, para que se calem, para que não falem e exponham seus pensamentos, para aqueles que os escutam ou convivem não precisem pensar e rever sua forma de olhar e estar com outro. 

Há autores que se questionam qual seria a responsabilidade do analista durante a crise de um sujeito psicótico? Mas qual seria a diferença durante a escuta de qualquer outro sujeito? Logo, qual é a responsabilidade ética frente a escuta daquele que nos procura, tanto em meio privado ou público? Há a leitura que o analista deve cuidar o que diz ao psicótico, pois poderá lhe causar uma injunção, provocar uma crise, um surto, por exemplo. O que assegura o analista de colocar ou não o sujeito em crise, tendo de cuidar o que diz para não provocar injunção? O furor curandis e a resistência, que é do analista, podem fazer com que o próprio analista não escute o sujeito frente a sua própria linguagem e sim em relação ao seu imaginário, ao imaginário do analista que está tomado pelo olhar e escuta da estrutura universal da lógica edipiana e não do sujeito.

“Quem fala? (2002, p. 33)”, domina a problemática da paranoia, pergunta Lacan em seu seminário das psicoses, mas como assim? Na alucinação verbal é dito que “o sujeito articula o que ele diz ouvir (p. 33)” que vozes são essas? Podemos parar por aí e ficar questionando e articulando a teoria sobre as vozes, ou então, escutarmos o que ele está fazendo com isso ou o que ele pode fazer? “Aquilo que não é simbolizado retorna no real”, já o delírio vai na direção daquilo que difere da linguagem comum pelo fato da significação ser fechada, ser algo de irredutível, não sendo flexível, não fazendo metáfora, sendo de uma ordenação comum do discurso e como se não pudesse ser algo nomeado singularmente. Percebemos isso frequentemente no espanto em que as pessoas têm ao ouvir algo que lhes cause extrema estranheza vindo de sujeitos ditos diferentes, ditos doentes mentais. Todavia, se um neurótico diz a mesma coisa, essa estranheza se transforma em algo engraçado, corriqueiro, ou alguma outra coisa, como um sonho, por exemplo, menos o grande estranhamento. Por que em um sujeito se trata de psicose e no outro não? Por que um é tratado como louco e o outro como normal?

Lacan diz que a dialética do delírio é constituída na relação pervertida em relação a realidade existente entre o Outro como aquele que não é conhecido, mas reconhecido enquanto tal e o outro como origem do conhecimento. Já Freud trouxe a diferença entre a psicose e neurose no texto A perda da realidade na neurose e na psicose (1924)[10], que a realidade para o neurótico se dá através da fantasia e a do psicótico através do delírio. Mas frente ao discurso enunciado pelo sujeito, o que diferencia?

Recordo-me de dois filmes, de vários outros na verdade, mas citarei dois deles por ora. O filme No portal da eternidade de Julian Schnabel traz cenas sobre a vida de Vincent Van Gogh nas aldeias de Arles e Auvers-sur-Oise nos arredores de Paris e sua internação em um sanatório, e o outro filme é Memória de um doente dos nervos de Julian Hobbs baseado no diário de Daniel Paul Schreber de 1903, e do que me recordo então? Para mim, há algo de semelhante em ambos os filmes, como em tantos outros, e em nosso cotidiano, ou seja, o olhar selvagem, julgador, preconceituoso em relação a esses sujeitos que se constituem de uma outra forma; a falta de respeito frente ao outro; o muro criado entre ambos, o analista e o analisante, entre o pintor e quem serve de inspiração, entre o médico e o paciente. Nesses filmes ambos eram tratados com estranheza, e suas internações tinham que funcionar de acordo com o que a psiquiatria da época expunha e exigia, não havia uma abertura clínica, prática ou teórica que fizesse pensar de forma diferente para estar atento ao que esses sujeitos expressavam ou sentiam. Podemos ver essas cenas no livro Textos Surrealistas[11] de Antonin Artaud onde ele escreve um texto que se chama Carta aos médicos-chefe dos asilos de loucos e esse recorte do texto diz o seguinte: 

“… Não levantaremos aqui a questão dos internamentos arbitrários, para evitar-lhes o desgaste das negações fáceis. Afirmamos que um grande número de seus pensionários, perfeitamente loucos segundo a definição oficial, foram eles também, arbitrariamente internados. Não admitamos que impeçam o livre desenvolvimento de um delírio, tão legítimo, tão lógico, quanto qualquer outra sucessão de ideias ou de atos humanos. A repressão das reações antissociais é tão quimérica quanto inaceitável em seu princípio. Todos os atos individuais são antissociais. Os loucos são as vítimas individuais por excelência da ditadura social; em nome dessa individualidade que é própria ao homem, pedimos que liberem esses condenados da sensibilidade, já que também não pertence ao poder das leis de aprisionar todos os homens que pensam e que agem (p. 98)”.

Lacan chega a perguntar “Será que o doente fala? …ele fala, mas fala como um boneco aperfeiçoado que abre e fecha os olhos, …” (2002, p. 45), assim já pensava De Clérambault, de maneira mecânica, automática, como se aquilo que o sujeito traz em sua fala, em seu discurso, em sua língua, em sua linguagem fosse algo não pensado, não sentido, como se fosse praticamente um robô, como se a sua língua pudesse ser traduzida por uma lista de categorizações para poder enquadrá-la em sua estrutura, retirando-lhe a sua singularidade. O sujeito é o seu discurso, é isso o que o analista interpreta, na interpretação do inconsciente[12], inclusive na psicose. O discurso do sujeito se mostra através de sua realidade interna e externa, na sua construção de verdade. É na linguagem que o sujeito percebe, articula, interpreta e expressa aquilo que é seu, da sua singularidade, através de sua fala. O que nos faz, então, pensar que o sujeito psicótico não o faz?

Relendo textos de Lacan e de seus contemporâneos, percebo o quanto a tentativa desesperada em poder enquadrar um sujeito dentro de uma lógica fechada, de uma certeza assevera os psicanalistas. Já não bastasse a psiquiatria fazendo isso juntamente aos DSMs, CIDs há décadas, por exemplo, a psicanálise também faz isso e de forma escrachada. Na lição de 14/12/1955 Lacan diz “via-se nele uma neurose” (2002, p. 74), será? Ou via-se o que se queria ver, para o analista permanecer em seu patamar glorioso como aquele que sabe do sujeito mais que o próprio sujeito. Os próprios lacanianos esqueceram, ou não escutaram, ou somente leram de forma não crítica aquilo que o próprio Lacan disse. Não esqueçamos que Lacan era um psiquiatra na década de 30 em diante, podemos ver em suas apresentações de pacientes a sua busca para enquadrar o sujeito naquilo em que ele atentava em ser o correto. Lacan durante seu seminário vai enfatizando a importância do discurso, porém, o discurso do sujeito psicótico exprime-se em uma língua desestruturada (p. 82, 2002) da língua comum.

Todavia, em suas apresentações de doentes no Hospital Sant’Anne, Lacan escutava seus pacientes na frente de estudantes, residentes da clínica psiquiátrica e nos relatos a que hoje temos acesso e se tivermos uma leitura crítica frente suas interpretações, muitas vezes é estranha a forma como ele se dirige ao sujeito que está ali na sua frente e na frente de muitas outras pessoas. Fica nítido e muito claro o quanto sua escuta se direciona àquilo que ele quer mostrar aos estudantes, ou seja, a fenomenologia da psicose. Os próprios “doentes” o questionam, interrompem suas perguntas tentando falar aquilo que desejam, corrigindo Lacan e discordando dele e de suas interpretações pretensiosas para não dizer sem nexo. A lucidez com que essas pessoas se apresentam é espetacular, e do lugar de seres rejeitados da sociedade passam a ser protagonistas de sua história e de sua fala, porém o que lhes falta, é uma escuta ética e digna de um psicanalista que está ali num lugar de suposto saber e não de um saber curioso. Mais uma vez Artaud[13] (1983) nos surpreende com sua lucidez e rigor a um olhar atento a si e ao seu entorno, diz ele:

“Não nos surpreendemos com vosso despreparo diante de uma tarefa para a qual só existem uns poucos predestinados. No entanto nos rebelamos contra o direito concedido a homens – limitados ou não – de sacramentar com o encarceramento perpétuo suas investigações no domínio do espírito.

E que encarceramento! Sabe-se – não se sabe o suficiente – que os hospícios, longe de serem asilos, são pavorosos cárceres onde os detentos fornecem uma mão-de-obra gratuita e cômoda, onde os suplícios são a regra, e isso é tolerado pelos senhores. O hospício de alienados, sob o manto da ciência e da justiça, é comparável à caserna, à prisão, à masmorra”.

Harari nos traz que ao testemunhar sua experiência, a do inconsciente, o analista estaria passando “do campo privado ao campo público”[14], mostrando ou colocando em questão a sua própria experiência do lugar de analisante. A partir dessa questão, questiono-me em que lugar se coloca o analista ao escutar o sujeito dito na psicose? O que é tão aterrorizador? Já escutei muitos psicólogos e psicanalistas dizerem que tem medo da psicose e não da neurose, qual a diferença? Como que escutar o sujeito enquadrado na neurose fosse algo muito simples e tranquilo, pois estaria dentro da “normalidade”. Lacan passa a exposição do Seminário 3 trazendo questões relacionadas a histeria com o caso Dora, por exemplo, trazendo seu lado psiquiatra a frente de qualquer possibilidade de leitura em relação a psicose ao falar de Schreber. Parece-me muito curioso, como muitos psicanalistas se baseiam num relato escrito autobiográfico de um sujeito, ao tratarem do “O caso Schreber[15]”, como se cada um deles tivessem escutado Daniel Paul Schreber. Não o escutaram, mas o leram em seu livro[16]? A cada escrito frente a esse texto, depara-se com aquilo que o analista pensa, com o seu imaginário, com o seu saber e não com aquilo com que o analisante dito psicótico fala. 

A fala desses sujeitos dito psicóticos, seus pensamentos são abortados antes mesmo de iniciarem a falar, pois ali não há lugar, se não são sujeitos, quem dirá analisantes. Muitos analistas o recebem com o preconceito, com julgamento, com a categorização de seu ser estabelecido, ou é esquizofrênico, ou é paranoico, ou bipolar ou algum transtorno dos milhares existentes no DSM que mais recentemente tirou a psicose da infância, nem passado a psicose tem mais. 

A relação do sujeito com a própria fala é trazida por Lacan em De uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose[17], como também, a questão da fenomenologia, a classificação que

Freud faz em relação aos tempos do édipo e para onde isso leva o tratamento, ou seja, a uma “referência metódica ao Édipo” (p. 553) em que o sujeito ao não passar pelo édipo, não se torna um sujeito, e o que ele é então? Se o inconsciente, segundo Lacan, é estruturado como uma linguagem, como que aquilo que o sujeito fala não tem valor? Como é que se pode reduzir a fala do sujeito, então, dito psicótico como algo banal, sem importância? Se a metáfora é uma produção discursiva do sujeito, e esse sujeito não faz metáfora, o que ele faz? E em que lei ele opera ou não opera? Como condicionar a sua questão frente ao diagnóstico e problematizar algo que o próprio Schreber, por exemplo, não o fez num processo de análise, pois a teoria sobre a psicose que Freud criou está baseada no livro do Presidente Schreber? Como dizer que o sujeito não tem o que fazer com a sua vida?

Sendo assim, será que se escuta o sujeito? Por que há tanta diferenciação nessa escuta? Por que tanta categorização? Percebo hoje em minha prática clínica a mudança, a passagem de um lugar de acompanhamento, secretariado da estrutura do sujeito psicótico, ao lugar de escuta do sujeito, independentemente de sua estrutura psíquica e de todas as amarras que isso traz. A análise é um lugar de produção do sujeito, é o lugar do sujeito se colocar em análise e não de acompanhá-lo na manutenção de seu sintoma e de seu adoecimento na psicose. 

Se entramos no jogo de responder do lugar de onde o sujeito nos coloca, estabelecemos uma relação dual, lugar de querer saber do outro, de curiosidade, e isso não é psicanálise. O sujeito expressa sua linguagem de forma multimodal, de várias maneiras, sendo assim, como dizer que o psicótico não faz isso? Ou que não pode entrar em análise? Benveniste[18] diz na teoria da enunciação em que todo discurso do sujeito contém o “tu”, já Lacan[19] adapta e diz que em todo discurso contém o “outro”, ou seja, para aquele a quem me dirijo já compõem a minha enunciação, acredito que esse outro a quem me dirijo é um suposto saber, é o próprio sujeito que sabe de sua verdade, lembremos, suposto saber. 

Como dizer que o sujeito psicótico não sabe de si e de sua verdade? E que sua reinvindicação não é digna de ser escutada como a de qualquer outra pessoa, como a de qualquer outra estrutura? Enquanto analistas, ao analisar o discurso, analisa-se tanto a enunciação, o enunciado, como também, o enunciador, suas expressões, o tempo e a sua linguagem. Ali o sujeito da enunciação faz uso de significantes e não somente das palavras, é nesse sentido que o analista interpreta os significantes. Trata-se de uma posição ética do analista, no qual faz o analisante se escutar, escutar a sua verdade, ao contrário de fazer sentido ao analista. É uma grande ilusão, um equívoco achar que o outro entende o que dizemos porque esse dito faria parte daquilo que é compartilhado por todos, diz-nos Pêcheux[20]. Não é à toa que os sujeitos ditos psicóticos são colocados sempre no lugar de estranhos, ou que estão em surto, pois talvez, não estão compartilhando do mesmo discurso que a maioria das pessoas, como falamos anteriormente. Confere? O sujeito é sempre um intérprete de sua história, de sua vida, ele fala de suas singularidades, como então, “deve” falar algo que o outro concorde, ou que seja semelhante ao que esse outro pensa e espera? A forma como o sujeito percebe o que está em seu entorno é somente dele, como o analista em sua escuta é alguém tão preconceituoso ou julgador, que no momento em que a pessoa a sua frente se expressa de maneira diferente ao que ele espera, ele pode afirmar que esse sujeito não entrará em análise? Possivelmente não entre mesmo, mas devido a sua incapacidade de escutar e não pelo que o sujeito está expressando. Pierce[21] traz em sua construção a abertura para a indeterminação em seu processo, a interpretação é indeterminada, é algo novo, o sujeito é atuante, reconhece-se pelo seu valor de fala, de intérprete, de sujeito.

O sujeito é estruturado como uma linguagem diz Lacan[22], ele não é uma estrutura, mas sim, um discurso, há aí uma mudança na posição de escuta, onde a linguagem em que o sujeito se expressa tem referência, portanto, tem valor. Sua referência é seu lugar de sujeito e intérprete de sua singularidade, de sua enunciação. Como então, olhar e escutar esse sujeito dito psicótico que nos procura e afirmar que o que ele fala enquanto delírio não tem valor, pensando somente como um raciocínio psiquiátrico, como algo fechado. Escuto uma mulher há alguns anos em que tem mais de 5 diagnósticos psiquiátricos, para contextualizar, e que luta incessante e incansavelmente, que protesta e reivindica ser ouvida por todos que estão ao seu redor, para que escutem o seu sofrimento. Por algum tempo, trabalhando com ela e frente a uma leitura estrutural que tinha, penso hoje que eu a acompanhava em seus “delírios” após uma cirurgia nasal, Fliess possivelmente se interessaria por esse caso. Nesse ensaio não se trata de trabalharmos esse caso, mas expressar um pouco a leitura sobre tudo o que já foi exposto. Quando apresentei esse caso na Formação do Instituto Langage, no final um colega perguntou qual a diferença nessa passagem de acompanhá-la para escutá-la. Penso que seja gigante diante a percepção de vê-la fechada em sua possível estrutura, a psicose, e hoje, aberta e produzindo frente as suas questões, lidando com a sua vida, construindo e respondendo seus questionamentos, dentro de sua singularidade, como um sujeito que ela é. Melman[23] diz que a paranoia é “a certeza para um sujeito de ter o saber da verdade, da verdade absoluta (p. 13)”, que o paranoico acredita escapar do destino, e que até mesmo nós normais temos um receio do que há no outro lado da fronteira, e “que todas as paranoias terminam pelo êxito da autopunição” (p. 19), entre tantos adjetivos, assustador e revoltante são os que me vem em mente, e que considero diferente do que ocorre nesse caso e em tantos outros. Mas encontramos esses relatos na bibliografia psicanalítica.

Ao contrário, Moutapha Safouan[24] se questiona “o que é que nós analisamos? (p. 16)” e cita D. Lagache:

“Tomemos as palavras do paciente. É evidente que enquanto analista não estou unicamente interessado na significação objetiva daquilo que o doente quer me dizer: estou também, e sobretudo, interessado não no que ele se recusa a me dizer, mas no que escapa ao mesmo tempo às suas comunicações intencionais e às suas recusas conscientes (p. 16)”

A sociedade edipiana em que vivemos, onde o patriarcado ainda governa, repleta de regras infundadas, ou já decaídas, ou mesmo, despencando em queda livre, ainda vê o outro como aquele que ameaça, o diferente ainda causa espanto, mas quem é igual? Vivenciamos absurdos acontecendo em pleno século XXI, e podemos nos questionar o que mudou? Já avançamos em muitas questões, mas olhar para o arcabouço de questões a serem trabalhadas, percebemos que temos muito trabalho pela frente. Muitos analistas ainda tratam o sujeito psicótico como um não humano, como alguém incapaz, resultado de um delírio do raciocínio psiquiátrico no qual há uma total ausência de valor daquilo que o sujeito é. Diferentemente, de olhar o sujeito em relação a sua própria metáfora, onde aquilo que o sujeito é, diz, expressa-se tem valor. Realmente, não tem como ser analista, escutar, interpretar se não se considera aquilo que o sujeito é, tem valor, se não se coloca no lugar de suposto saber, não tem como escutar e interpretar para que o sujeito faça uma torção no significante e permita o deslizamento dessa cadeia significante. A resistência é do analista Lacan[25] nos alerta. Porém, muitos fazem da teoria uma verborragia, uma eterna reprodução do que já foi dito e escrito, a leitura atenta e criação em que Lacan convoca os analistas permanece em suspenso para uma grande parte daqueles que não compreenderam o que é ser suposto saber, e que permanecem na manutenção estrutural do sujeito.

A ideia de nosso trabalho, numa perspectiva pós-lacaniana está relacionada a uma mudança de olhar de quem olha[26] em relação ao sujeito e não uma abolição do mito do édipo. Ele é um mito grego, utilizado por Freud no século passado para falar sobre o sujeito, citando 3 categorias, 3 possibilidades de o sujeito lidar com o mundo. A psicose é colocada como o pior dos adoecimentos frente as outras, algo que não deu certo, ao invés de ser vista como uma forma outra de constituição do sujeito, nem melhor, nem pior. No discurso psicanalítico ainda enfrentamos essa questão da impossibilidade de ser do sujeito, quando se permanece no diagnóstico estrutural. Deixando que o sujeito permaneça numa posição escrava, onde a incompreensão de seus ditos e atos, são traduzidos pela maioria e principalmente pelos analistas como loucura28, como algo fora de sua compreensão compartilhada com a maioria das pessoas. Há uma inversão na posição, a dificuldade está no lado daquele que não escuta, pois, enquanto analistas não estamos ali para compreender, como diz Lacan no Seminário sobre as psicoses[27]. Se nos apoiamos na linguagem para estabelecermos uma relação, para sermos sujeitos e nos tornando singulares, como não reconhecer a capacidade simbólica do outro?

Em minhas anotações para escrever esse texto, vista em uma série que estou tentando lembrar qual, havia a seguinte frase: “… dizem que os negros, os animais e os loucos não sentem…”, isso é de uma brutalidade, de uma selvageria sem fim, todavia, já ouvi muitos psicanalistas dizerem que os loucos não sentem. Mais uma vez, a pergunta: como assim? Saímos de uma constituição universal e estrutural do édipo, para uma constituição da singularidade do sujeito, não abolimos o édipo, mas estamos pensando para além dele, ou seja, para outras possibilidades de constituição do sujeito, diferente de um fechamento de descrições nosográficas onde impera o adoecimento e a patologização do sujeito[28]

Será que esses escritos citados anteriormente ainda sustentam a escuta de hoje? Muitas coisas mudaram, o mundo se transforma a cada dia, apesar de ainda caminharmos a passos lentos, mas caminhamos. Os hospícios de outrora não são as mesmas instituições de saúde mental de agora, apesar de enfrentarem ainda muitas dificuldades, não sei se principal, mas de grande relevância em nosso lugar de escuta, pois ainda há muito julgamento e fechamento nesse olhar frente ao outro. Onde já se viu tamanha lucidez como nas falas Estamira[29], em que ela esbraveja seu lugar no mundo e questiona aquilo que não faz sentido para ela, o sujeito dito neurótico não faz isso também? Ela pergunta “onde estava Deus quando ela foi estuprada, sendo que, Deus existe para proteger as pessoas”. Poderíamos aqui discorrer também, sobre o filme Coringa de 2019, o maníaco suicida, como é citado em vários lugares, mas se mostrando lúcido em sua constituição quando julgou quem merecia morrer naquela emblemática cena onde ele mata um ex-colega na frente do rapaz anão que desesperado ao tentar sair do apartamento não consegue, pois não alcançava o trinco da porta. Coringa diz a ele que não o mataria, pois o rapaz não tinha lhe feito mal. Obviamente que a cena de assassinato ou essa resolução nesse ato, é terrível, mas a construção de seu pensamento é importante. 

A burocracia frente ao tratamento, o absurdo social violento em relação a esses dois personagens e a maneira como eles encontraram formas de lidar com suas vidas, assustam muito as pessoas. No dia que fui ao cinema ver o filme do Coringa, as pessoas saíram chocadas, indignadas com o “horror” da violência dele frente aos outros personagens, mas vi poucos falarem sobre a história do Coringa e o que pode ter acarretado seu destino; colegas psicanalistas estavam preocupados, o pai do Bruce Wayne era ou não o pai do Coringa? Foi a falta desse pai que fez tudo isso, entre outros comentários. Para o próprio Coringa[30] é apenas “um dia ruim” que separa um homem são da loucura. Na série de TV, Mr. Robot – Sociedade Hacker, Elliot, um rapaz que é programador também vivencia conflitos em seu trabalho e consigo mesmo, onde frente a tudo o que lhe acontece ele cria uma maneira de lidar com as próprias criações de sua mente e fazer uso delas a seu favor. 

Vemos inúmeros sujeitos lidando com a sua vida, com o seu fazer no mundo, mas até quando permaneceremos errantes? Errantes na errância de um caminho que nos guia a não olhar, a olhar de forma extremamente embaçada para o sujeito dito psicótico, através do diagnóstico? Ao analista “cabe a aposta na singularidade”[31], aposta nas criações e construções que o sujeito possa fazer, nas possibilidades que ele cria frente ao seu desejo para lidar com o seu entorno. Podemos ser um meio nesse processo de construção, jamais o saber sobre o outro.

Sendo assim, a crítica feita nesse trabalho é para podermos pensar sobre esse olhar psiquiátrico em que o próprio Lacan transmitiu de sua clínica, como também, ao mito do édipo como universal, como um mito pode ser a base do que se é um sujeito? Encerro então, essa reflexão com um escrito de Artaud[32] o qual mostra uma sensibilidade e lucidez sem igual do sofrimento de um sujeito que foi encarcerado e desejando que os pâmpanos floresçam:

“A paralisia me possui e me impede cada vez mais de voltar-me sobre mim mesmo. Não tenho mais ponto de apoio, não tenho mais base… me busco não sei onde. Meu pensamento não pode mais ir aonde minha emoção e as imagens que se erguem em mim o carregam. Sinto-me castrado até em meus mínimos impulsos. Acabo por ver o dia através de mim mesmo, de tantas renúncias em todos os sentidos de minha inteligência e de minha sensibilidade. É preciso que entendam que é de fato o homem vivo que é atingido em mim e que essa paralisia me sufoca está no centro da minha personalidade usual e não dos meus sentidos de homem predestinado. Estou definitivamente à margem da vida. Meu suplício é tão sútil, tão refinado quanto ele é áspero. Preciso de esforços insensatos de imaginação, multiplicados pela pressão dessa sufocante asfixia para conseguir pensar o meu mal. E se me obstino assim nessa busca, nessa necessidade de fixar de uma ver por todas o estado de meu sufoco… (p. 10)”.

Grata!!


[1] Dedicatória de Moustapha Safouan em seu livro: Estudos sobre o édipo: introdução a uma teoria do sujeito.

[2] CID – 10. Classificação dos Transtornos Mentais e de Comportamento da CID – 10: Descrições clínicas e Diretrizes Diagnósticas – Organização Mundial da Saúde, trad. Dorgival Caetano. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

[3] LACAN, Jacques. O Seminário livro 3 – as psicoses. Rio de Janeiro: J.Z.E., 2002.

[4] ROUDINESCO, Elizabeth.  Jacques Lacan: Esboço de uma vida, história de um sistema de pensamento. São Paulo:

Companhia das Letras, 1993.

[5] LACAN, Jacques. Da psicose paranoica em suas relações com a personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011.

[6] LACAN, Jacques. 8 presentaciones de enfermos em Sainte-Anne (Diciembre 1975 – Abril 1976). Documento de uso interno de la Federación de Foros del Campo Lacaniano (FFCL-España F7).

[7] QUINET, Antonio. Teoria e clínica da psicose. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014.

[8] Calligaris, Contardo. Introdução a uma clínica diferencial das psicoses. São Paulo: Zagodoni, 2013.

[9] LAZNIK, Marie Christine; TOUATI, Bernard; BURSZTEJN, Claude. Distinção clínica e teórica entre autismo e psicose na infância. São Paulo: Instituto Langage, 2016.

[10] FREUD, Sigmund. A perda da realidade na neurose e na psicose (1924). In: O Ego e o Id e outros trabalhos (19231925) – Vol. XIX. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

[11] ARTAUD, Antonin. Textos surrealistas. Belo Horizonte: Moinhos, 2020.

[12] MILLER, Jacques-Alain. A interpretação pelo avesso. Opção Lacaniana, nº 15, 1996, p. 96-99.

[13] ARTAUD, Antonin. Escritos de Antonin Artaud. Tradução, notas e prefácio de Claudio Willer. Porto Alegre: L&PM, 1983.

[14] HARARI, Roberto. Apresentações Clínicas. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2009.

[15] FREUD, Sigmund. Notas psicanalíticas sobre um relato autobiográfico de um caso de paranoia (Dementia Paranoides) 1911. In: O caso Schreber, Artigos sobre a técnica e outros trabalhos (1911-1913) – Vol. XII. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

[16] SCHREBER, Daniel Paul. Memórias de um doente dos nervos. Tradução e organização de Marilene Carone. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. 

[17] LACAN, Jacques. De uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose. In: Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.

[18] BENVENISTE, ÉMILE. Problemas de Linguística Geral. Campinas: Pontes, 1995.

[19] LACAN, Jacques. O Seminário livro 2 – o eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise. Rio de Janeiro: J.Z.E., 2010.

[20] PÊCHEUX, Michel. O Discurso – estrutura ou acontecimento. Campinas: Pontes Editores, 2015

[21] PIERCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 2000.

[22] LACAN, Jacques. A instância da letra no inconsciente ou razão desde Freud. In: Escritos. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1998. 

[23] MELMAN, Charles. Como alguém se torna paranoico? Porto Alegre: CMC Editora, 2008.

[24] SAFOUAN, Moustapha. Estudos sobre o édipo: Introdução a uma teoria do sujeito. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979.

[25] LACAN, Jacques. A direção do tratamento e os princípios de seu poder (1958). In: Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.

[26] RIQUENA, Celso. Notas sobre valor, trabalho e psicose. Instituto Langage – GT Psicanálise Pós-edipiana.

27 LACAN, Jacques. O Seminário livro 3 – as psicoses. Rio de Janeiro: J.Z.E., 2002.

28 RIQUENA, Celso; MURAKAMA, Carlos; SANTOS, João Vitor. Como nasce um psicótico no mundo contemporâneo. Instituto Langage – GT Psicanálise Pós-edipiana, 2017. 

[29] Estamira (Estamira Gomes de Souza) é um filme documentário brasileiro dirigido por Marcos Prado e produzido por José Padilha (2005). https://www.youtube.com/watch?v=IcUKQNj3HEg

[30] MOORE, Alan. Batman: a piada mortal. Barueri: Panini Brasil, 2020.

[31] NOGUEIRA, Olivia. O diagnóstico estrutural e a ética da psicanálise: uma insustentável contradição. Instituto Langage – GT Psicanálise Pós-edipiana.

[32] ARTAUD, Antonin. Para acabar com o juízo de Deus e outros escritos. Belo Horizonte: Moinhos, 2020.

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